quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

As forças que regem a vida

Existem três fatores que circundam a vida do ser humano: o mero acaso, o destino e as conseqüências.

O acaso tem a ver com os acontecimentos totalmente aleatórios, mais ou menos relevantes, que ocorrem em nosso cotidiano. Não os traçamos nem são ditados por nada ou ninguém. Podem influenciar nossos rumos, ainda que provisoriamente e mesmo a despeito de nossa vontade, nos abrir oportunidades ou não representar absolutamente nada de relevante.

Do destino, ocupam-se inteligências superiores, que, vez por outra, movem as peças do tabuleiro para nos criar certas oportunidades. Como é dito, oportunidades não se perdem: ou as agarramos, ou outros as agarram; portanto, o que faremos com os instrumentos que nos são postos à disposição está no âmbito de nosso livre arbítrio, isto é, as forças do destino apenas nos põem diante de determinadas situações, cabendo a cada um de nós reconhecer e decidir sobre o que fazer com as oportunidades que daí advêm.

As conseqüências, por seu turno, podem resultar de fatos da natureza, de terceiros ou próprios. Nas duas primeiras categorias (fatos da natureza e de terceiros), nosso livre arbítrio encontra-se mais rarefeito, mas, ainda assim, a natureza do aspirante à Rosa+Cruz o impelirá a exercer sua capacidade de observação para identificar oportunidades de engrandecimento, empoderamento e, sobretudo, de Serviço à Grande Obra.

Já os atos próprios nos chamam totalmente à responsabilidade. Afinal, não só estão diretamente vinculados ao exercício do nosso livre arbítrio, como têm o condão de refletir, de modo mais ou menos intenso, na vida alheia. Mesmo diante do mero acaso ou do destino, o Rosa+Cruz reconhece a responsabilidade ínsita a cada ato próprio, a cada escolha que faz, a cada palavra que profere. Servidor do Altíssimo, reconhece a Sombra das Asas que estão acima de si e propõe-se a transformar não apenas o Chumbo, mas até mesmo o Lodo, em Ouro e Luz espirituais, que potencialmente beneficiarão a si, aos que estão ao seu redor e à humanidade em geral.

A Fraternitas Rosicruciana Antiqua e sua influência telêmica


Conversando com um Irmão R+C acerca da natureza de algumas sociedades que se apresentam sob a denominação "Rosa Cruz", ressurgiu a velha questão: a Fraternitas Rosicruciana Antiqua é uma organização telêmica?

A ocasião não era propícia para uma exposição mais alongada, mas, por tratar-se de um assunto recorrente, certamente haverá novas oportunidades para debatermos sobre o tema.

Por ora, resolvi deixar aqui um resumo do entendimento que me resulta da vivência pregressa na FRA de Krumm-Heller, assim como na O.T.O. e na A.'.A.'. de Crowley:

(I) Se se pensa na literalidade de Thelema ("Vontade"), a FRA, como qualquer outra organização de cariz iniciático, é uma fraternidade telêmica. Afinal, não se pode prescindir da vontade no caminho da espiritualidade.

(II) Se, por outro lado, se pensa em Thelema como o sistema filosófico/mágico/religioso proposto por Aleister Crowley - dotado de elementos operativos, doutrinários e filosóficos de identidade própria, então a resposta não é tão linear. Senão, vejamos:

a - nenhum exercício prescrito por Crowley integra o currículo operativo da FRA, nem figura a doutrina telêmica em sua grade de estudos oficial.

b - Nenhum dos rituais formulados por Aleister Crowley é adotado em sua integralidade pela Fraternitas Rosicruciana Antiqua. Porém, aqueles que já tiveram a oportunidade de participar dos rituais de congregação da FRA, certamente perceberão a forte inspiração de dois deles em escritos de Crowley, notadamente Liber CCXX e Liber XV (o terceiro ritual é de antiquíssima origem greco-egípcia). A conhecida admoestação de Krumm-Heller, no sentido de que "tereis de dar conta de todos os vossos atos", em seguida do "Faz o que tu queres", é, em termos puramente iniciáticos, desnecessária. Afinal, quando se está a realizar e Verdadeira e Divina Vontade (Thelema), não há Carma a se temer.
Em diferentes passagens, Crowley cuidou de deixar claro que "Faz o que tu queres" não significa "Faz o que te agrada". Logo, a admoestação do Mestre Huiracocha, ou é sinal de um entendimento superficial da mensagem telêmica, ou expressa um excesso de zelo com a natural superficialidade dos membros recém-iniciados.
De uma forma ou de outra, isto não revela qualquer incompatibilidade da FRA em relação a Thelema, cabendo relembrar que, quando da elaboração dos Rituais pelo Mestre Huiracocha, o Novo Aeon ainda era bastante incipiente.

c - a magia sexual ritualística não é um elemento central no caminho proposto pela FRA, que se difere sensivelmente da vertente proposta por Crowley. Sem me alongar, posso afirmar que a utilização da energia sexual no sistema de Krumm-Heller guarda semelhanças com alguns sistemas orientais de "Alquimia Interna", compreendendo, ainda, o conhecimento e a aplicação dos biorritmos e dos tatwas. Krumm-Heller propunha um caminho monogâmico, passível de ser plenamente percorrido, independentemente do gênero do praticante, recomendando que se evitasse o que entendia como desperdício da energia sexual (o desperdício não vem do desuso, mas sim do mau uso).
No entanto, no final de sua vida, Krumm-Heller começou a delinear um curso de Magia Sexual, chegando a ter feito anotações sobre o texto-base da famosa obra "Magia Sexualis", atribuída a P. B. Randolph.  Sem dúvida, essa obra serviu de inspiração para a composição das ideias sobre magia sexual propagadas pela antiga (e extinta) O.T.O. e absorvidas por Crowley.
Aqui, cabe mencionar que o Capítulo XII da Novela Rosacruz faz referência aos manuscritos da Irmandade Hermética da Luz sobre o tema - textos sabidamente influenciados/escritos por Randolph e postos à base de escolas como a OTO de Theodor Reuss e o Collegium Pansophicum de Heinrich Tränker.
Logo, é correto afirmar que o Mestre Huiracocha reservava para o nível mais avançado da FRA a revelação de "segredos" (hoje, não mais tão secretos) de magia sexual, bem mais próximos do sistema do Mestre Therion do que a orientação inicial dada em seus livros, revistas e cursos.
Essa preocupação com a exposição reservada desses "segredos" pode ser facilmente explicada pela proximidade que o Dr. Krumm-Heller mantinha, também, com o Dr. Ernst C.H. Peithman (Basilides), fundador da Igreja Gnóstica de Eleusis - o qual repudiava publicamente as ideias de Crowley. Ao pretender-se sucessor de Peithman, Krumm-Heller obviamente não poderia reconhecer abertamente a validade das ideias sobre Magia Sexual que inspiravam e eram defendidas por Crowley.
Os que têm acesso às notas finais do Mestre Huiracocha saberão que a compatibilização dessas técnicas, a princípio tão distintas, se dá pela aplicação do que ele chamava de "sexualidade científica", isto é, pela utilização de um ou outro método de acordo com os biorritmos do praticante.

Como se vê, não há nada que permita desprezar a influência de Crowley sobre Krumm-Heller, que o considerava um verdadeiro Mestre, ao lado de Papus, Levi, Reuss, Hartman, Tränker e Peithman, por exemplo. Tal influência é inegável para qualquer membro do círculo interno da FRA e dá a esta um sabor próprio e especial, que a distingue das demais sociedades rosicrucianas. A insistente tentativa de criar uma barreira em relação a Thelema, além de artificial, tem sido causa de visíveis distúrbios intelectuais e energéticos entre os membros da Fraternidade.
O que se deve ter em mente é que a FRA se vale da leitura peculiar dada a Thelema pelo Doutor Krumm-Heller - ele próprio um Mestre de grande estatura espiritual, que soube enxergar a necessidade de adaptação dos sistemas iniciáticos vigentes em sua época às premissas do Novo Aeon.